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Um ano e quatro meses após o início da pandemia, o mundo já vacinou mais de 733 milhões de pessoas. A eficácia prometida pelas vacinas parece estar a comprovar-se no mundo real, mas uma pessoa vacinada não pode relaxar totalmente. Seis dúvidas essenciais, esclarecidas com a ajuda do epidemiologista Manuel Carmo Gomes

Portugal até pode ter vacinado cerca de dois milhões de habitantes, mas o número representa apenas 20% da população. Os restantes 80% convivem diariamente com quem foi vacinado, numa mistura que, apesar de parecer hoje ser menos perigosa do que se acreditava há alguns meses, não deixa de ter riscos, mesmo para quem já recebeu a vacina.

O epidemiologista Manuel Carmo Gomes sublinha a importância de não abandonar as medidas de higiene e mitigação, relembrando que ainda são necessários meses de estudos para se conseguir saber ao certo a probabilidade de uma pessoa vacinada ser capaz de transmitir a Covid-19. À VISÃO esclareceu ainda algumas das principais dúvidas que assolam portugueses vacinados ou à espera da vacina.

1. Quantos dias após termos tomado a vacina ganhamos realmente imunidade?

Apesar de a imunidade conferida pelas vacinas começar a surgir ao fim de sete dias, Manuel Carmo Gomes aconselha a considerar 10 a 14 dias como o período, ao fim do qual, se atinge 90% de imunidade. Este período e percentagem são, segundo o epidemiologista, “bastante constantes entre todas as vacinas”.

2. Quanto tempo dura a imunidade após a 1ª dose de vacina?

Os especialistas ainda não sabem exatamente. Manuel Carmo Gomes refere que a única certeza que existe é que, entre o 14º dia após a primeira dose e o dia de toma da segunda, os 90% mantém-se.

Se, no caso da Astrazeneca, falamos de cerca de 12 semanas entre a primeira e a segunda dose, para as vacinas da Pfizer e da Moderna, que têm intervalos de 21 e 28 dias entre tomas, Carmo Gomes afirma, “ a minha experiência com vacinas diz-me que os 90% devem durar até às seis semanas após o 14º dia depois da primeira dose”.

Mas atenção, como sublinha o epidemiologista, “as pessoas têm ter noção que, apesar desta eficácia elevada após o 14º dia, devem tomar a segunda dose de vacina”. Será a toma da segunda dose a assegurar uma imunidade muito mais duradoura no tempo e a elevar a eficácia até cerca de 95%, explica o especialista.

3. Quanto tempo dura a imunidade após a 2ª dose de vacina?

Uma vez que os ensaios clínicos de todas as vacinas atualmente aprovadas foram feitos há menos de um ano, ainda não se sabe exatamente. “O mais certo é durar muitos meses”, afirma Carmo Gomes. Apesar de a eficácia prometida por algumas vacinas, como a da Pfizer, ser de 95%, este é um valor obtido em ensaios clínicos.

“Estas coisas, depois, têm de ser medidas no terreno, no mundo real”, sublinha Manuel Carmo Gomes. Quando a eficácia de uma vacina é medida no mundo real passa a chamar-se efetividade e, em geral, costuma ser levemente mais baixa do que a eficácia obtida nos ensaios clínicos, “porque estão presentes todos os tipos de pessoas que não estavam nos ensaios”.

4. Qual a efetividade das vacinas no mundo real?

Apesar de, apenas agora, começarem a surgir os primeiros estudos, a 29 de março o Centro de Controlo e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos (CDC) publicou um estudo segundo o qual as vacinas da Pfizer e da Moderna apresentavam uma efetividade de 90%, considerada, por Carmo Gomes, muito elevada. “Pesquisas de coorte prospetivas realizadas em profissionais de saúde, trabalhadores essenciais e outros trabalhadores da linha da frente, ao longo de 13 semanas em oito locais dos EUA, confirmaram que as vacinas de mRNA Covi-19 autorizadas (BNT162b2 da Pfizer-BioNTech e mRNA-1273 da Moderna) são altamente eficazes em condições do mundo real”, escrevem os investigadores, acrescentando, “a eficácia da vacina (imunização completa com duas doses de vacinas de mRNA) foi de 90%”.

5. Mesmo vacinado, posso ser infetado?

Existem três cenários diferentes. Se uma pessoa foi vacinada, mas ainda não passaram 14 dias desde a primeira dose, então a imunidade não está totalmente formada e, por isso, pode ocorrer infeção. Se uma pessoa foi totalmente imunizada, mas acaba por estar nos 5% fora da eficácia das vacinas, também está sujeita a ser infetada. Se não se verificar nenhuma das hipóteses anteriores, existem diversos níveis de gravidade de infeção, com probabilidades diferentes de ocorrerem.

As vacinas foram criadas para evitar doença grave e morte. No que respeita estas duas consequências, a eficácia é, segundo Manuel Carmo Gomes, “quase 100% em todas as vacinas aprovadas”. Quando se trata de infeção menos grave, mas, ainda assim, sintomática, o epidemiologista fala em valores próximos de 90%, ou seja, altamente improvável de acontecer.

Já no caso de infeções assintomáticas, os cientistas estão ainda em estudos, mas tudo indica que a probabilidade de desenvolver este tipo de infeção baixa significativamente com a vacina. Por exemplo, dados de Israel, onde cerca de 60% dos 9 milhões de habitantes receberam, pelo menos, uma dose de vacina, sugeriram que a vacina Pfizer-BioNTech é 94% eficaz na prevenção de infeções assintomáticas.

Também o CDC defendeu, num estudo publicado a 29 de março, que tanto a vacina da Pfizer como da Moderna eram eficazes na proteção contra infeções assintomáticas. A única vacina que testou a capacidade de proteção contra infeções, durante os ensaios clínicos, foi a Astrazeneca, chegando a valores de cerca de 59%.

6. Mesmo vacinado, posso transmitir a doença?

“As pessoas que são infetadas, estando vacinadas, têm uma carga viral muito inferior à carga viral que temos quando somos infetados sem ter qualquer proteção”, afirma Manuel Carmo Gomes, explicando que, desta forma, “parece que, mesmo que seja infetada, a probabilidade de uma pessoa vacinada transmitir a doença é muito menor do que se não tivesse sido vacinada”.

De qualquer forma, o epidemiologista diz que, até termos certezas e conseguirmos quantificar quanto é que diminui a capacidade de um vacinado transmitir a doença, teremos ainda de esperar muitos meses e ir monitorizando as pessoas vacinadas ao longo deste ano. Por essa razão, é importante continuar a usar medidas de proteção pessoais, por respeito à restante população.


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